Estou aqui perdida entre algumas reflexões, hoje é 12 de outubro, feriado nacional brasileiro, de cunho religioso, em virtude da padroeira, Nossa Senhora Aparecida; contudo o que vi ser comemorado foi o consumismo, num apelo ao alusivo dia das crianças. As lojas lotadas, as filas intermináveis, a economia movimentadíssima.
Saí um pouco mais cedo a um centro de compras próximo à minha casa, o local geralmente tem um movimento razoável de pessoas, mas hoje estava incomumente abarrotado de pessoas, de sacolas, de consumismo selvagem e desenfreado.
Não critico aos que consomem; minha crítica, repulsa e indignação é por constatar que poucos são os que podem consumir. Entretanto, a lógica do capitalismo é tão cruel e insaciável que motiva até mesmo os que não podem ao consumo irracional.
Bom, com todas estas ideias e pensamentos pairando em minha cabeça, senti o ímpeto de compartilhá-los com vocês, contudo adiei, até que me deparei com a seguinte frase naquele popular microblog febre da contemporaneidade: "Eu queria, como a grande maioria, estar triste pq amanhã volto ao trabalho, mas estou triste pq não tem trabalho pra ir..."
Essas palavras tocaram profundamente a minha alma... Parece que a gente só se dá conta de como a vida é injusta quando se defronta com este tipo de comentário, mas quantos são os que no dia de amanhã terão apenas mais um dia de "folga", aqueles cuja vida é um suceder contínuo de "feriados"?
Fico p*** da vida quando recebo correntes de e-mails nojentas falando mal dos programas sociais, e da assistência social como um todo. Aqueles que criticam e chacoteiam tais medidas não conhecem a realidade dos que não tem sequer uma colher de farinha para se alimentar, não receberam educação nem oportunidades de viver outra vida. Certamente não sabem como é morar em um cômodo de 4m², nem imaginam como é viver sem qualquer tipo de renda e ainda assim seguir a vida, ter esperança, acreditar em dias melhores.
Trabalhar com a política de assistência social tem proporcionado um grande aprendizado para mim, pois nosso objetivo vai além do concreto, do benefício eventual ou emergencial, dos programas de transferência de renda, temos de trabalhar com dores, esperanças, angústias e perspectivas, com PESSOAS e não apenas com situações-problema. Enfim, é complexo e desafiador (quem sabe outro dia compartilho mais sobre isso com vocês).
Hoje o que eu queria era lembrar das inúmeras crianças que tiveram este dia como mais um dia de suas vidas, sem presentes, sem direitos respeitados, sem consumo. Lembrar de seus pais, trabalhadores ou desempregados crônicos, que simplesmente se esforçam para viver a vida, por mais dura e sacrificante que ela seja.
Sou de opinião que todos gostam, desejam e querem consumir, mas infelizmente nem todos tem possibilidades de fazê-lo. Não pensem que encaro os "vulnerabilizados socialmente" como vítimas ou pobrezinhos, não! Nem acredito que todos os que pedem realmente necessitam. Acredito que os maiores necessitados não reclamam assistência, simplesmente se resignam à sua condição e (sobre)vivem mediante suas dores e desgraças particulares.
Inúmeros sãos os cientistas sociais que apreendem a questão da pobreza como consequência direta do capitalismo, sim é verdade. Mas constatar esta relação de causa e efeito não vai solucionar nada. Pensar em um novo modelo de economia, de consumo, de produção, de política não tem alterado muito a história do nosso país e do nosso mundinho globalizado.
Enquanto nós permanecermos alheios à estas questões, isolados no conforto do nosso universo particular e das nossas teorias que não explicam nada, sinceramente as coisas não se alterarão. Sinto falta da efervescência dos movimentos sociais, da união das pessoas em prol de um objetivo nobre, das massas reunidades lutando por direitos de uma coletividade. Sabe, sinto falta da movimentação que os livros de História me mostravam quando se falava da ditadura militar brasileira... E vejo claramente, como escreveu Belchior, que "ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais". Resta saber, até quando?
Eu pergunto primeiramente para mim, até quando vou me isolar do mundo, vou me refugiar no virtual, vou me manter em cima do muro, vou esperar o tempo passar e não fazer nada? Até quando vou enterrar meus talentos e me esquivar de fazer a diferença? Não sei vocês, mas eu, como cantou Michael Jackson, "I'm starting with the man in the mirror" (Eu quero começar com o homem no espelho). Pois sei que enquanto eu não me decidir a fazer algo nada será feito, claro que não vou fazer grande coisa, mas como disse Gandhi: "Qualquer coisa que você faça será insignificante, mas é muito importante que você faça".
Acredito nisso e sei que há muito a ser feito, por menor que seja nossa ação, podemos sim fazer a diferença contra todo o horror que está instalado. Sim, certamente não vou mudar o mundo, mas se eu conseguir mudar a mim mesma frente a tudo isso que está instalado, creio que já valeu a pena.