segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Das confissões da saudade

E quando um belo dia você percebe que o passado veio te visitar e se vê desenterrando algo que estava a sete palmos de terra?

E quando você acompanha as lembranças atuais de alguém, que pra você, já morreu?

Quem nunca stalkeou nesta era digital, que atire a primeira pedra.

Quem nunca se viu, mesmo sem sentido ou lógica, indo procurar nas redes sociais por alguém que fez parte da sua vida em um passado remoto que me condene.

Hoje eu não suportei. Peguei o celular e comecei a buscar. E, em cada foto que aparecia na tela, eu via alguém que eu gostaria que fizesse parte da minha vida hoje.

E, me senti profundamente tocada, ao ver que aquele alguém até cozinha atualmente, que mudou em muita coisa e que talvez permaneça o mesmo em tantas outras.

Bateu saudade. E quem nunca sentiu saudade de quem foi cedo demais ou daquilo que nem sequer viveu, que me crucifique.

Tenho a impressão de que, se hoje eu pudesse, bateria na porta dele. Não para pedir desculpas ou para me declarar. Não para agradecer ou reivindicar qualquer coisa. Mas somente e tão somente para olhar mais uma vez em seus olhos e dar o meu melhor sorriso.

Algumas partidas são perdas, outras livramento, e você, o que é, afinal?


sábado, 29 de agosto de 2015

Sozinha, quebrada e perdida.

Gradativamente, eu percebo que estou me afastando das pessoas e, de modo particular, me aproximando delas. Estou em um movimento de afastamento de multidões, de quantidades, de massas, no qual minha socialização se encolhe progressivamente à meia dúzia de gatos pingados.

Tenho minhas plantas, meus projetos, minhas inquietações. Tenho minha espiritualidade, minha estrada de chão batido que me leva para dentro de mim. Tenho os que dividem o cotidiano comigo e ninguém mais.

Sempre fui meio antissocial e não é novidade estar sozinha e querer estar sozinha. Gosto do meu lugar, do meu espaço reservado, de cultivar as minhas individualidades e é sempre difícil abrir a porta deste meu mundo e deixar qualquer pessoa entrar.

O hábito de me trancar é tão arraigado que durante as minguadas tentativas de me abrir a alguém percebo uma dificuldade imensa e, muitas vezes, a necessidade de usar um escudo, uma armadura, uma proteção.

O mais irônico é que o afastamento do todo me aproxima muito de mim, mas me faz perder um pouco do tato do convívio social. E, como boa cozinheira que sou, sei que perder a mão é garantia de estragar a receita, até a melhor delas.

Assim, paira sempre no ar a dúvida de que: será que eu só encontro as piores pessoas para me aproximar ou que faço/ extraio dessas pessoas apenas o seu pior?

Hoje eu me vi no meio de uma conversa sobre drogas e, da forma mais inusual possível, me senti tremendamente inadequada. Não sei se pela falta de contato com as pessoas com as quais conversava, não sei se por não ser de modo algum simpática às substâncias psicoativas, não sei.

Mas a sensação de inadequação mexeu muito comigo e me fez ter vontade de sair correndo em busca de outras pessoas com as quais pudesse tecer redes de empatia, de familiaridade, que entendessem o que eu estava sentindo. No afã de aplacar a sensação de estar sozinha no mundo, minha cabeça recorreu à busca desenfreada por pessoas.

Mas, passada a emoção do mal-estar, me veio novamente os questionamentos da razão: Até que ponto vale a pena me cercar de quaisquer pessoas para me sentir menos sozinha, menos inadequada? E será que no meio de um turbilhão de carência, de solidão, de mal-estar, é possível discernir quem realmente me entende e está próximo a mim de verdade e com reciprocidade.

Às vezes eu me sinto perdida em um labirinto e, em todas as tentativas, não encontro um caminho a trilhar. Eu sinto medo de seguir sozinha. Eu sinto medo de não ter para onde ir. Eu tenho medo, principalmente, de não saber o que fazer. E nesses momentos de fragilidade eu queria muito ter alguém com o qual eu pudesse contar, chamar, gritar, estar, pedir socorro, acompanhar.

E é justamente nesses momentos em que o universo grita para mim, de todas as formas, a mensagem de que a solidão, o vazio e o esfacelamento do meu ser não podem e nem serão preenchidos com qualquer coisa, qualquer pessoa, qualquer metade igualmente quebrada. É preciso mais. Preciso ir adiante e ousar encontrar em mim tudo aquilo que minha carência me empurra a buscar em outros e perceber que só assim poderei ser inteira e estar aberta, não a qualquer companhia, mas a quem chegar para ficar, do jeito que mereço, do jeito que eu possa corresponder.

domingo, 16 de agosto de 2015

Mercantilização do outro



Nesses últimos dias alguns acontecimentos tem me levado a refletir sobre o valor das pessoas. Lembro das aulas de economia política em que o Bigodão, professor querido do meu coração, explicava os conceitos de valor de uso e valor de troca. A grosso modo o valor de uso é a utilidade social do objeto. Enquanto o valor de troca seria o valor do objeto mediante o tempo de trabalho e a matéria prima nele gastos.

E confesso que tentar compreender em que ponto da humanidade nós passamos a ver as pessoas com as quais nos relacionamos como um jogo de capital me deu um certo nó no juízo. Na verdade vejo uma proximidade assustadora do conceito de valor de troca como filosofia norteadora de alguns (muitos) relacionamentos.

Nessa nossa falida sociedade machista e capitalista seria algo como:

  • Quanto você vale? 

- Você vale uma ligação demorada?
- Você vale um jantar?
- Você vale uma noite de sexo?

E pronto. Dificilmente o ciclo continua a partir daí. Afinal, tem muitas figurinhas novas para preencher o álbum. Mas alguém me responda, por favor, que álbum patético é esse? Que bizarrice é essa de colecionar casos de uma noite, ou apenas frações disso, desenfreadamente? Qual o prazer que se tem de transformar as pessoas em mero objetos?

Talvez eu soe completamente conservadora e quadrada em meus questionamentos. Talvez seja meio démodé insistir em romantizar os casos e teimar em acreditar no amor e coisa e tal.

Ao longo dos meus trinta anos eu perdi muito do meu romantismo e meiguice, mas ainda não consegui perder o respeito pelo outro. Não consegui a proeza de jogar, seduzir, iludir e investir energia com intenção de levar alguém pra cama e depois desaparecer (até quando?).

Mas apesar disso, chega uma hora em que o cinismo acaba contagiando e a gente que é humano igual a todo mundo (será?) pensa: E se eu cansar de ser tratada como objeto e resolver, já que sou objeto, cobrar o meu valor de troca?

Estava conversando com uma colega ontem e ela, machista declarada, me falava de seu último homem. Falava de sua condição de mulher independente e da mesmice que era encontrar alguém que não acrescentava, não somava valor ou experiências significativas (para além do abstrato) aos seus dias. E foi bonito de ouvir e compartilhar da sinceridade e verdade dessa mulher.

E essa conversa só me fez reafirmar minha convicção íntima de não me rotular machista ou feminista, porque muitas vezes esses conceitos tão discutidos nas rodas de conversa da vida acabam não sendo suficientes para abarcar a realidade. Será que é injusto um ser objetificado pelo outro começar a cobrar, em forma de valores concretos, pelo aluguel de seu corpo, paciência e envolvimento? Será que mesmo os machistas convictos ou os feministas esclarecidos nunca se viram numa relação afetivo-mercantil? Será que é machismo, feminismo, prostituição? Será que a vida cabe mesmo em caixinhas de conceitos?

Enfim, acho que estamos ainda afogados pela hipocrisia, que - como onda constante - vem e nos afunda, nos tira o ar e a clareza de quem realmente somos e do que realmente fazemos e queremos fazer. Será que no auge da minha consideração pela dignidade alheia e do respeito pelo território sagrado do outro eu nunca quis algo mais, uma compensação?

Bom, o que eu consigo ver é que poucas coisas nessa vida são gratuitas. E por mais que eu não queira, peça ou espere um valor financeiro, nos relacionamentos, minha tendência é querer uma retribuição pelo tempo, afeto e participação oferecidos com a tão cobiçada reciprocidade. Então, como julgar alguém que, diferente de mim, cobra um jantar, um presente, uma mensalidade da academia/faculdade?

E existem casos de pessoas que querem estar com alguém bonito, interessante, inteligente, independente e tantos outros "in's", no entanto essas pessoas pouquíssimas vezes tem o mesmo a oferecer de volta. Nesses casos, o que fazer? Como cobrar? A cobrança financeira começa até a soar justa... Sei que é um tema delicado e controverso. Peço perdão aos que se ofenderem com as palavras fortes usadas, mas é que realmente é um assunto que tem me incomodado bastante recentemente.

Acho que vou começar a ler mais sobre o assunto, porque viu, não tá fácil não...